top of page

Sacrifício ao Amor

 

 

Texto: Afonso Cruz 

 

Quando acabava de correr pelo jardim, Františka costumava inclinar-se sobre os traços que os seus sapatos haviam sulcado no chão e lia o que diziam

Pronunciava sentenças solenes, muito séria

E obrigava Sors a beijar o chão (para acordar a terra, para acordar os mortos)

As palavras é que são as coisas

A palavra água ou se bebe...

... ou afoga-nos

E há a palavra mar

que afunda todos os navios

E sem a palavra horizontal só poderíamos sonhar acordados. Os sonhos de dormir são mais distantes

Aquelas tardes eram eternas e duravam infinitos

Sors abria os braços e ela atirava as bolas de neve, sem qualquer compaixão

Sors recebia o impacto com prazer, como se estivesse a ser fuzilado pelo amor

bottom of page